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      EDITORIAL

      Sara Figueiredo Costa

      Quando o escritor inglês L. P. Hartley escreveu, no romance O Mensageiro, a célebre frase que diz que «o passado é um país estrangeiro: lá, as coisas são feitas de maneira diferente», referia-se aos enganos da memória e à rapidez com que tudo muda, deixando-nos perante um irreconhecível que pode não ter acontecido assim há tanto tempo. A intenção estaria longe de ser essa, mas a frase de Hartley cristalizou uma ideia de passado encerrada lá atrás e apenas acessível por memória, directa ou indirecta, o que parece isentar o passado de todas as responsabilidades. Ora, o passado é coisa mais viva do que essa citação nos leva a crer, que o diga o escritor brasileiro Itamar Vieira Junior, que acaba de lançar o seu segundo romance, voltando à trilha de questionar o que já aconteceu sem fazer disso assunto arrumado. O facto de há uns séculos ser costume largar pessoas em arenas de leões não faz do costume uma coisa sadia, muito menos inquestionável. Em conversa com o Parágrafo, o autor que venceu vários prémios com o seu primeiro romance, Torto Arado, falou sobre as histórias guardadas no seu novo livro, Salvar o Fogo, e sobre a importância de entender a história como um fluxo permanente cujos ecos mais antigos não deixam de se escutar no presente.

      Conhecer esse país que é o passado também passa por observar-lhe os quotidianos mais banais, e não apenas os acontecimentos que, por vicissitudes várias, ficaram registados nas efemérides da História. A essa observação se dedica o livro Material Contradictions in Mao’s China, coordenado por Jennifer Altehenger e Denise Y. Ho para a University of Washington Press. Dos materiais como o bambu e o tijolo até aos objectos de uso doméstico, passando pela comida ou pelo cinema, este livro percorre algumas décadas de história quotidiana à medida que reflecte sobre a cultura material da China maoista, oferecendo-nos uma porta de acesso privilegiado a um tempo que já não existe. E onde, de facto, as coisas se faziam «de maneira diferente».

      Em destaque nas diversas secções deste suplemento estão livros para todas as idades, do belíssimo ensaio visual sobre a descoberta de si próprio que é Os Reflexos de Henriqueta, álbum de Marion Kadi, ao manual sobre a escrita de biografias assinado pelo grande biógrafo Ruy Castro, passando pela história do militar japonês que passou mais de 30 anos na selva, convencido de que a guerra continuava, escrita por Werner Herzog. Como sempre, há espaço para muito mais leituras e para as habituais crónicas de Dora Nunes Gago e José Luís Peixoto. Regressaremos quando o Verão estiver mais a pique, prometendo não distinguir leituras de praia de quaisquer outras – afinal, não é o lugar que explica o que lemos.