“Frammenti Di Luce” é uma instalação arquitectónica criada por Carlos Marreiros que combina as suas memórias pessoais com a beleza da paisagem alpina do norte de Itália, resultando numa estrutura que procura incentivar o diálogo entre a arquitectura orgânica e a natureza. A criação desta peça é fruto de uma fusão entre as memórias de infância do arquitecto e a grandiosidade das montanhas que a circundam.
“A Arte Sella Contemporary Mountains é um dos maiores museus ao ar livre da Europa. Eles começaram, há muitos anos, a convidar principalmente artistas plásticos, fundamentalmente esculturas. Nos últimos anos a tendência foi para convidar mais arquitectos para fazerem instalações”, disse Carlos Marreiros ao PONTO FINAL. Um desses projectos arquitectónicos, intitulado “Frammenti Di Luce”, foi concebido pelo arquitecto macaense. Na sua peça, Marreiros funde as suas memórias de infância com a grandiosidade da paisagem alpina, criando uma estrutura que convida à interacção e à reflexão.
Na sua descrição do projecto à Revolti, um dos principais fabricantes e fornecedores de chapas e trabalhos em metal de Itália, Marreiros comentou as qualidades visuais e as intenções por detrás do design, marcadas por “Chaminés altas e esguias, com uma base pequena e cones irregulares, onde a luz podia troçar de nós”. Este imaginário expõe uma narrativa mais profunda, que remete para os seus sonhos de infância. “Imaginava estruturas cónicas, escuras por dentro e imperfeitas, onde podia esconder os meus sonhos”, acrescentou ainda o arquitecto.
O projecto foi concretizado através do trabalho de vários empreiteiros, incluindo Revolti, Zintek, Galloppini Legnami e Pedretti Graniti, sob a supervisão técnica do Professor Marco Imperadori. A atenção aos pormenores é evidente na sua construção, nomeadamente na concepção da cobertura. A Revolti enfrentou o desafio de conceber uma cobertura que se adaptasse perfeitamente à disposição irregular do pavilhão. A utilização de chapas douradas, trabalhadas para ligar as várias partes do telhado, reflecte a intenção artística do arquitecto e a precisão técnica da equipa.
A concepção da cobertura tem um duplo objectivo, melhorar o aspecto estético e proporcionar uma protecção essencial, ao abrigar os perfis verticais dentro de uma bolsa, evitando a delaminação da madeira devido à exposição solar e aos elementos naturais. “A permeabilidade da estrutura não requer qualquer forma de isolamento; a chapa adere simplesmente a uma placa de separação”, observou a Revolti, sublinhando a integração da estrutura com o ambiente.
Arte Sella, a associação cultural que alberga o pavilhão, ganhou reconhecimento pela sua dedicação em misturar a arte, a natureza e o envolvimento da comunidade.
Durante mais de trinta anos, o local acolheu uma série de expressões humanas, tornando-se um dos maiores museus ao ar livre da Europa. Ao longo dos anos, mais de 300 artistas contribuíram para a evolução da sua narrativa e criaram experiências artísticas entrelaçadas com a natureza.
Em declarações ao PONTO FINAL, Carlos Marreiros reflectiu sobre a influência das montanhas que circundam a sua peça. “Os países do Norte têm a tradição dos gigantes”, referindo-se aos picos imponentes do Norte de Itália. A sua experiência inicial em Trento foi de espanto e descreve ter-se sentido “esmagado pelo tamanho das montanhas”, um forte contraste com a escala mais pequena das paisagens a que estava habituado em Macau. “Sempre fui muito urbano”, explicou, referindo que o ponto mais alto de Macau tem apenas 99 metros. A sua experiência em Trento alargou a sua compreensão da escala e da beleza natural, o que influenciou o seu trabalho.
Como parte da tendência crescente da Arte Sella de convidar arquitectos para criar instalações, “Frammenti Di Luce” destaca-se pela sua interactividade. “Na minha peça, as pessoas podem entrar, tocar e sentar-se. É praticável”, sublinhou Marreiros, sugerindo uma relação íntima entre o público e a obra de arte. A sua escolha de materiais reflecte um compromisso com a integração orgânica. “A peça é toda feita de madeira; só a base é metálica”, explicou. “Quis escolher materiais orgânicos. Não faria sentido utilizar plástico ou acrílico; não se integraria na paisagem. Não queria que a peça fosse um grito”.
Carlos Marreiros recorreu às suas memórias para reforçar a narrativa do projecto. Inspirado por experiências de infância na Fortaleza do Monte, recordou os túneis escuros que trepava, iluminados por uma luz fragmentada que se filtra através de grelhas de granito. “Quando éramos miúdos, tínhamos medo porque o túnel era escuro, mas havia fragmentos de luz… Era um espectáculo bonito, quase de lazer”, recordou. Esta ligação reflexiva faz com que “Frammenti Di Luce” deixe de ser uma mera arquitectura e passe a ser uma homenagem pessoal, crê o arquitecto, espelhando os seus medos e alegrias de infância, projectados agora no ambiente alpino.