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      InícioEntrevista"Preferia que Macau mantivesse as suas características próprias o maior tempo possível"

      “Preferia que Macau mantivesse as suas características próprias o maior tempo possível”

       

      Carlos Monjardino vai a Goa para participar nas celebrações dos 30 anos de actividade da delegação indiana da Fundação Oriente. Antes disso, parou em Macau para se encontrar com O Lam, a nova secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, com quem pretende falar sobre intercâmbios culturais e sobre a importância do IPOR para a região. Ao PONTO FINAL, mostrou-se esperançoso que Sam Hou Fai tenha mais atenção à cooperação com Portugal e comentou que a RAEM não tem desempenhado devidamente o papel de plataforma sino-lusófona. Monjardino anteviu também uma influência cada vez maior de Pequim em Macau, assinalando que gostava que “Macau mantivesse as suas características próprias o maior tempo possível”.

      FOTOGRAFIA ELOI CARVALHO

      A caminho de Goa, onde vai assinalar os 30 anos de actividade da delegação indiana da Fundação Oriente, Carlos Monjardino fez questão de vir a Macau. O presidente do conselho de administração da Fundação Oriente vai encontrar-se com a nova responsável da pasta dos Assuntos Sociais e Cultura, O Lam, para tentar promover um maior intercâmbio cultural entre o Governo da RAEM e a delegação de Macau da Fundação Oriente, bem como destacar a importância do IPOR na região. Em entrevista ao PONTO FINAL, mostrou-se optimista em relação a Sam Hou Fai e disse que o novo Chefe do Executivo parece ser “mais acessível a projectos com Portugal”. Ainda assim, Monjardino afirmou que Macau “não tem cumprido totalmente o papel de plataforma sino-lusófona”. Sobre os próximos 25 anos do período de transição de Macau, anteviu uma influência cada vez maior de Pequim na região.

       

      Nestes dias em Macau, vai reunir-se com membros do Governo da RAEM?

      Vou, com a secretária para os Assuntos Sociais e Cultura.

       

      O que é que pretende discutir?

      Há sempre algumas coisas que estão pendentes. Também gostava de dar uma palavra em relação ao IPOR [a Fundação Oriente tem uma participação de 40% na actividade do IPOR]. Sobre a Fundação, queria tentar trazer mais coisas aqui para a Casa Garden, algumas manifestações culturais, e saber se poderemos trabalhar mais em conjunto com as entidades de Macau, nomeadamente com ela, que é a responsável pelo sector cultural.

       

      Relativamente ao IPOR, o que é que irá ser discutido com as entidades da RAEM?

      Quero, mais uma vez, chamar a atenção para a importância que o IPOR tem para o ensino do português, que vai beneficiar em muito os estudantes chineses.

       

      Em Novembro de 2023 disse, em entrevista ao PONTO FINAL, que gostava que a Fundação tivesse um papel mais preponderante na vertente social em Macau…

      Também disse que percebia que, depois de 1999, o Governo local quisesse ter essa responsabilidade antes de mais ninguém, portanto diminuiu a nossa responsabilidade nessa área.

       

      A margem de manobra diminuiu, mas haverá alguma coisa que se possa fazer na vertente social?

      Haver, há, mas são coisas pontuais e relativamente pequenas ou pouco importantes. Por exemplo, nós ajudamos uma associação que se ocupa de menores que tem a responsabilidade de acolher menores que têm problemas ou que não podem viver dentro do contexto familiar e vão para lá viver e nós, todos os meses, apoiamos essa instituição.

       

      Em 2023 também disse que a Fundação Oriente teria de fazer uma contenção nos gastos. Isso tem tido impacto os trabalhos da Fundação?

      É óbvio que tem sempre impacto. Numa instituição cultural, o problema não é arranjar coisas para fazer, é arranjar dinheiro para poder fazer essas coisas. Às vezes, os responsáveis pela área cultural da Fundação – como em todas as fundações – não fazem muitas contas. Querem fazer as acções, mas não vêem aquilo que é necessário para poderem levar essas acções a bom termo.

       

      Algum projecto em particular que gostasse de ter realizado e não conseguiu devido a essas contenções nos gastos?

      Não, eu não deixo que esses projectos avancem demasiado, morrem na casca.

       

      Em Macau, essa contenção de gastos também se fez notar?

      Aqui não. O orçamento continua a ser mais ou menos a mesma coisa. Às vezes, os delegados puxam muito para haver mais acções sem pensarem muito “com o que é que se compram as bananas”.

       

      Aqui em Macau também?

      Aqui tem corrido tudo bem.

       

      Agora não se vai encontrar com o novo Chefe do Executivo de Macau, Sam Hou Fai?

      Não. Eu tentei, mas ele tem uma agenda complicada e eu também vou estar aqui poucos dias.

       

      Tentou porque havia algum assunto que gostasse de discutir com ele?

      Não, era só para o cumprimentar, já que não o conheço.

       

      Não o conhecendo, daquilo que tem visto e do que tem lido, qual a impressão que tem dele?

      Causou-me uma boa impressão. Acho que ele é mais aberto a pensar em projectos com Portugal, até porque tem uma base portuguesa forte por ter estado em Portugal e estudado na Universidade de Coimbra. Dá-me a impressão que é uma pessoa mais sensível a projectos com Portugal.

       

      O novo Chefe do Executivo da RAEM tem dito que dá muita importância à comunidade portuguesa em Macau. Acha que poderá resolver a questão das restrições dos novos pedidos de residência para portugueses?

      Espero que sim. Fazer qualquer coisa por isso, sim; resolver o problema completamente é capaz de ser difícil.

       

      O que é que dificulta a situação?

      Não faço a mínima ideia. Há uma protecção clara para que os cidadãos chineses possam chegar a cargos mais elevados e isso certamente que é uma preocupação que qualquer pessoa que estivesse na posição em que ele está teria.

       

      Também há a questão dos quadros qualificados que o Governo quer trazer para Macau…

      Sim, mas têm de ser mesmo quadros qualificados. Dantes, vinha toda a gente, qualificada ou não qualificada. No meu tempo era um vê se te avias. Agora, eles fazem essa selecção e eu percebo perfeitamente que o façam.

       

      Acompanhou a visita recente do Presidente Xi Jinping aqui a Macau?

      Sim.

       

      O Presidente chinês falou sobre o papel de Macau na estratégia de abertura ao exterior da China, nomeadamente através das funções de plataforma sino-lusófona. Macau tem cumprido esse papel?

      Se quer que responda diplomaticamente, digo que a resposta é: “Sim, senhor”. Se quer que responda sem ser diplomaticamente, digo que não tem cumprido totalmente o papel de plataforma sino-lusófona.

       

      Em que é que se nota isso?

      Não aparecem resultados materializados, ficam sempre aquém daquilo que eu esperava. Nomeadamente negócios, investimento português aqui. O investimento importante não é feito através de Macau, é feito directamente entre a China e Portugal e não passa por Macau, e deveria passar. O Governo podia fazer mais nesse sentido.

       

      Como espera que a RAEM se desenvolva nesta segunda metade do período de transição, até 2049? Como é que imagina a Macau de 2049?

      Espero que progressivamente a China vá ocupando Macau em termos de influência, que já não é pouca. O Presidente da China quererá, dentro do seu mandato, fazer a reunificação da pátria, ou seja, com Taiwan.

       

      Isso terá consequências para Macau?

      Com certeza.

       

      Imagina uma Macau mais diluída no continente chinês e, consequentemente, com menos características próprias?

      Sim. Mas é natural que assim aconteça, não é uma crítica. É algo que eu penso que vai acontecer naturalmente.

       

      Mas não era suposto até 2049 não mudar muito?

      Era suposto não mudar muito. Talvez não mude muito, mas vai mudar alguma coisa.

       

      Como é que olha para essa trajectória? Concorda que assim seja, ou preferiria que Macau mantivesse todos os seus elementos distintivos até 2049?

      Preferia que Macau mantivesse as suas características próprias o maior tempo possível.