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      Início Entrevista "Espero que aquilo que ficou combinado na Lei Básica se cumpra"

      “Espero que aquilo que ficou combinado na Lei Básica se cumpra”

      A caminho de Pequim, Carlos Monjardino passou por Macau. No território, encontrou-se com a presidente do Instituto Cultural, com o presidente da Fundação Macau e fez questão de ir ao Grande Prémio. Na capital chinesa, vai renovar um protocolo de cooperação cultural. Em entrevista ao PONTO FINAL, o presidente do conselho de administração da Fundação Oriente desde 1988 confessa que gostava que a organização tivesse um papel mais preponderante na vertente social em Macau. Instado a comentar as críticas que dizem que, no território, há mais restrições aos direitos e liberdades dos cidadãos, Monjardino diz-se “preocupado”, mas ressalva que “não esperava outra coisa”.

      Carlos Monjardino vai a Pequim, mas, no caminho, não quis deixar de passar em Macau. Aliás, em entrevista ao PONTO FINAL, confessou que vê Macau como a sua segunda terra. O presidente do conselho de administração da Fundação Oriente desde 1988, ano em que foi criada, aproveitou a breve visita ao território para se encontrar com Leong Wai Man, presidente do Instituto Cultural, a quem pediu ajuda para renovar a Casa Garden. Pedido esse que está “bem encarreirado”, adiantou. Na capital chinesa, Monjardino vai renovar a cooperação cultural entre a China e Portugal, através da Fundação Oriente, no âmbito do “China International Cultural Association” (CICA). Questionado sobre o desenvolvimento da RAEM nos últimos 24 anos, Monjardino, que chegou a desempenhar o cargo de governador substituto do Governo de Macau entre 1986 e 1987, comentou que o rumo traçado tem sido o esperado, acautelando: “Espero que aquilo que ficou combinado na Lei Básica se cumpra, e que o princípio ‘Um país, dois sistemas’ se mantenha”. Às críticas de que há mais restrições aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, Carlos Monjardino mostrou-se “preocupado”, no entanto, afirmou que “não esperava outra coisa”.

       

       

      A Fundação Oriente completou agora 35 anos. Como é que avalia o trabalho que tem sido desenvolvido pela fundação ao longo destes anos?

      Tem sido sempre de acordo com o planeado inicialmente e com os objectivos da fundação, com alguns pequenos desvios a meio do percurso, não tanto por culpa da fundação, mas porque as condições à volta da acção da fundação durante algum tempo também não foram as melhores.

       

      Como em que ocasiões, por exemplo?

      A vertente social da Fundação Oriente aqui em Macau é quase nula. Antes de 99 fazia algum sentido e era importante, agora, percebe-se que as autoridades locais querem tomar essa área completamente em mãos. Entende-se isso, politicamente é o correcto e é o que tem de ser feito. Nós, obviamente, recuámos e deixámos de ser tão necessários como éramos antes de 99.

       

      Gostava que a fundação tivesse um papel mais activo na vertente social aqui em Macau?

      Eu gostava. Sobretudo numa área a que eu próprio me dedico na minha própria fundação [Fundação Monjardino], que é a da assistência a crianças que estão fora do contexto familiar. Eu faço isso com a minha fundação e faço isso um bocadinho com a Fundação Oriente. Aqui há matéria para se poder ajudar nesse âmbito. Há algumas crianças que estão entregues a instituições e que eu julgo que se poderia dar um salto qualitativo no que respeita à vida desses miúdos e ao seu futuro. É uma coisa que eu gostava de fazer.

       

      Neste contexto actual de Macau, pode-se fazer mais do que aquilo que tem sido feito, nessa vertente?

       

      Pode, com certeza. O território tem dinheiro para isso. Em Portugal falta dinheiro. Vontade há muita, mas depois não há dinheiro suficiente para fazer essas coisas.

       

      Então em Macau falta é vontade?

      Aqui falta o enquadramento. Não quero dizer que isto antes de 99 era melhor, porque não era. Eu tive um choque brutal quando fui visitar um orfanato aqui, era uma coisa absolutamente horrível. Não ponho as culpas em cima da Administração chinesa, nem pouco mais ou menos.

       

      Nos outros âmbitos, a Fundação Oriente tem cumprido os objectivos a que se propõe?

      Acho que tem. Isso também passa muito por alguma ligação com instituições do território. Nós estamos longe, portanto, há coisas que têm mesmo de ser feitas por instituições no território.

       

      Que projectos futuros tem para a acção da Fundação Oriente em Macau? Há alguma coisa em concreto que gostasse que a Fundação Oriente implementasse em Macau?

      Todos os projectos que a fundação implementa, seja aqui seja onde for, estão sempre dependentes dos fluxos financeiros que a fundação obtém dos investimentos que faz. No último ano foi uma desgraça, os mercados portaram-se como se portaram, e nós não podíamos continuar a gastar alegremente em grandes projectos. Agora, temos de ter uma maior contenção.

       

      Nesta curta passagem por Macau, o que é que está na sua agenda?

      Eu já falei com a presidente do Instituto Cultural, vou estar com o Wu Zhiliang [presidente da Fundação Macau] e uma outra coisa que é importantíssima para mim: vou ao Grande Prémio. Quando cá estava, não perdia o Grande Prémio. Até corria, punha-me dentro do carro e ia dar a volta à pista a acelerar.

       

      O que é que foi discutido na reunião com a presidente do Instituto Cultural?

      Foi discutida, por exemplo, esta casa [Casa Garden] e o seu interesse patrimonial. Pedimos que se lembrassem, nesta onda que há de recuperar património histórico, da Casa Garden. Há coisas que são da nossa conta e outras que podiam ter uma ajuda do Instituto Cultural.

       

      E houve abertura?

      Está bem encarreirado, é o máximo que posso dizer.

       

      A seguir, vai a Pequim. Qual será a sua agenda lá?

      Nesta viagem era só para ir a Pequim, nem era para vir a Macau. Mas eu vinha de Bali e passar em cima de Macau e não aterrar parecia mal. Eu sinto Macau como a minha segunda terra. Eu vou a Pequim assinar um protocolo, que já tem 25 anos de existência, com o CICA [China International Cultural Association], que é um departamento do Ministério da Cultura da China. É uma cooperação cultural. Eles sugerem acções chinesas em Portugal e nós [Fundação Oriente] sugerimos acções portuguesas na China. Fazemos isto há 25 anos e agora chegou a altura e vamos renovar o protocolo. Depois, vou também visitar o senhor embaixador de Portugal em Pequim.

       

      A RAEM está quase a fazer 24 anos. Como é que olha para o desenvolvimento de Macau desde a transferência de soberania? O rumo traçado tem sido o esperado?

      Não é muito diferente daquilo que eu estava à espera. Há coisas que claramente melhoraram. Espero que aquilo que ficou combinado na Lei Básica se cumpra, e que o princípio “um país, dois sistemas” se mantenha.

       

      Até aqui, acha que tem sido cumprido o que está na Lei Básica e no princípio “um país, dois sistemas”?

      Até há pouco tempo, sim. Depois, houve alguns sinais de que não seria exactamente assim. Eu fiquei preocupado, mas ainda é tempo de emendar a mão.

       

      Surgem, por vezes, críticas e queixas de que há cada vez mais restrições aos direitos, liberdades e garantias aqui em Macau. Como é que encara estas preocupações?

      Preocupado, mas não esperava outra coisa. Tendo a China tomado conta de Macau, as regras são as que se aplicam na China e não as que se aplicam em Portugal.

       

      Mas, se é assim, essas restrições às liberdades não entram em conflito com o que está estabelecido na Lei Básica e no princípio “um país, dois sistemas”?

      Entra um bocadinho. Mas nós estamos na China, não estamos noutro lado qualquer.

       

      Em Abril deste ano, esteve em Macau e disse, em entrevista ao Jornal Tribuna de Macau, que esperava que a presença portuguesa no território se mantivesse inalterada e que os portugueses continuariam a ter espaço. No entanto, recentemente, as autoridades de Macau começaram a restringir a atribuição de novos pedidos de residência para portugueses. Como é que olha para esta situação?

      Aí tenho de ser justo, acho que não é só para cidadãos portugueses. Nós estamos a puxar a brasa à nossa sardinha. É em relação a todos. Eu percebo perfeitamente que eles queiram aproveitar os quadros que têm cá ou que estão a formar. À medida que vão tendo esses quadros, vão dispensando os quadros estrangeiros.