O Ministério da Justiça da Coreia do Sul disse ontem que proibiu o Presidente Yoon Suk-yeol de viajar para o estrangeiro enquanto estiver sob investigação devido à imposição da lei marcial, na semana passada.
Durante uma audiência parlamentar, um funcionário da serviços de imigração do Ministério da Justiça, Bae Sang-up, disse que o Presidente sul-coreano Yoon Suk-yeol está proibido de viajar para o estrangeiro enquanto estiver sob investigação. O funcionário acrescentou que a proibição já tinha sido emitida.
Pouco antes, na mesma sessão, o procurador-chefe do Gabinete de Investigação de Corrupção para Funcionários de Alto Nível, Oh Dong-woon, disse que tinha solicitado esta proibição.
O gabinete, conhecido como CIO, é um dos vários organismos de segurança e judiciais, incluindo o Ministério Público e a polícia, a investigar as circunstâncias em torno da imposição da lei marcial por parte de Yoon.
Horas antes, a imprensa local tinha avançado que também a polícia sul-coreana estava a considerar proibir o Presidente de viajar para o estrangeiro, enquanto investiga possíveis suspeitas acusação de traição, rebelião e abuso de poder.
O principal partido da oposição da Coreia do Sul classificou a imposição da lei marcial por parte de Yoon como “rebelião inconstitucional e ilegal ou golpe”.
O Partido Democrático (PD) apresentou queixas junto da polícia contra pelo menos nove pessoas, incluindo Yoon e o ex-ministro da Defesa.
Os procuradores sul-coreanos detiveram no domingo o ex-ministro da Defesa Kim Yong-hyun, que terá recomendado que Yoon declarasse a lei marcial.
Embora o Presidente tenha imunidade contra processos judiciais enquanto estiver em funções, tal não se estende a alegações de rebelião ou traição.
Também ontem, a oposição criticou o Partido Popular do Povo (PPP), no poder, por se recusar a destituir Yoon.
“Por mais que tentem justificar (…) este é um segundo acto de rebelião e um segundo golpe, ilegal e inconstitucional”, disse Park Chan-dae, líder parlamentar do PD.
No sábado, Yoon escapou por pouco a uma primeira moção de destituição, submetida ao Parlamento. O PPP boicotou e invalidou a votação por falta de quórum.
Em comunicado, o PPP afirmou ter obtido, em troca do bloqueio da moção, a promessa de que Yoon se retiraria para deixar a governação do país à sua formação e ao primeiro-ministro.
“Mesmo antes da sua retirada, o Presidente não interferirá nos assuntos de Estado, nem nos assuntos externos”, certificou o líder do PPP, Han Dong-hoon, no domingo.
O presidente do Parlamento sul-coreano, Won Woo-shik, disse que “o exercício conjunto da autoridade presidencial pelo primeiro-ministro e pelo partido no poder (…) é uma clara violação da Constituição”.
Para Kim Hae-won, professor de direito constitucional na Escola Nacional de Direito de Busan, este acordo é semelhante a um “golpe de Estado silencioso”.
No domingo, o PD anunciou que vai tentar novamente destituir o Presidente, no dia 14 de Dezembro.
Yoon proclamou a lei marcial a 3 de Dezembro, uma medida que foi forçado a suspender apenas seis horas depois.
POLITÓLOGOS APOIAM DESTITUIÇÃO
Um dos quase 600 cientistas políticos que exigem a destituição do Presidente sul-coreano disse à Lusa que a declaração que assinaram pretende chamar a atenção do mundo para o que se está a passar no país.
“Enquanto cientistas políticos e académicos da área das Relações Internacionais, achámos que tínhamos de escrever algo e dar a conhecer ao mundo o que se passa”, disse em entrevista à Lusa Kim Hun-joon, professor na Universidade da Coreia (Korea University), em Seul, e um dos 573 signatários do documento, divulgado no domingo ao fim da tarde.
A declaração, traduzida entretanto para várias línguas – não está em português – pede a destituição do líder sul-coreano com vista a “restabelecer a ordem constitucional”.
Os signatários de várias nacionalidades classificam a declaração da lei marcial, imposta na terça-feira pelo Presidente sul-coreano Yoon Suk-yeol, e revogada poucas horas depois, “claramente, uma insurreição”.
“A lei marcial de emergência inconstitucional e antidemocrática torna irrelevantes as diferenças entre os partidos políticos que apoiamos, os nossos valores políticos ou as nossas crenças. Yoon ameaçou os direitos fundamentais dos cidadãos”, lê-se na declaração.
Kim Hun-joon considera que a declaração da lei marcial “é de extrema gravidade”, mas que o que se seguiu a esse momento “é ainda mais sério”, por “desrespeitar o processo constitucional”.
O PPP afirmou ter obtido, em troca do bloqueio da moção de destituição a promessa de que o Presidente se retiraria para deixar a governação do país àquela formação política e ao primeiro-ministro. Yoon não vai interferir nos assuntos de Estado, nem nas políticas externas, garantiu no domingo Han Dong-hoon, líder do PPP.
“Ao passar-se por um processo de destituição, a Constituição diz que, quando o Presidente está ausente por qualquer razão, o primeiro-ministro é o presidente interino. Mas, nesta altura, se o Presidente não for destituído e não estiver ausente, [o primeiro-ministro] não pode. Isso é abuso de poder”, nota.
A comunicação dos cientistas políticos refere ainda que Yoon “deve ser processado pelos seus actos e que a nação anseia por responsabilização”. Declara ainda que “uma pessoa não qualificada no cargo de presidente só traz infortúnio para o país e para o povo, mesmo que este se retire para os bastidores”.
Nas salas de aulas sul-coreanas, continua o documento, “vai ser ensinado o comportamento antidemocrático” de Yoon e dos deputados do PPP, que boicotaram e invalidaram a votação da destituição.
Além de uma renovada votação parlamentar, com vista ao ‘impeachment’ do dirigente sul-coreano, os signatários exigem um pedido de desculpas do PPP à população pelo boicote de 7 de Dezembro. Pedem ainda que os deputados do partido no poder participem na votação e que depois da moção de destituição, “todos os membros da Assembleia Nacional trabalhem em conjunto para deliberar e implementar medidas para restaurar e reforçar a democracia”.
Numa análise à razão pela qual Yoon declarou lei marcial, Kim Hun-joon refere os escândalos de corrupção que envolvem a família, além “da frustração” de Yoon no relacionamento com a oposição, que detêm a maioria de assentos parlamentares – 192 lugares contra os 108 do PPP.
“A oposição está perto da maioria qualificada. Se ele fosse um Presidente normal, provavelmente negociaria e depois daria algumas contrapartidas. É esse o processo democrático”, indica.