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      InícioOpiniãoNovo Chefe do Executivo, nova política do jogo?

      Novo Chefe do Executivo, nova política do jogo?

      O “Programa Político de Candidatura” (PPC) do candidato indigitado para sexto Chefe do Executivo da RAEM, Dr. Sam Hou Fai, aborda o jogo de forma aparentemente diferente. Após realçar os aspectos triviais – como a aplicação rigorosa da legislação do jogo, o aperfeiçoamento da legislação complementar, a fiscalização do cumprimento das obrigações das concessionárias de jogo (nomeadamente em matéria de responsabilidade social), a fiscalização do cumprimento dos contratos de concessão de jogo, a prevenção e o combate às actividades ilícitas e a promoção do jogo responsável – o PPC coloca a tónica, sem rodeios, no (único e já antigo) aspecto verdadeiramente essencial na actual fase do desenvolvimento “saudável” da indústria do jogo: o jogo como motor principal da promoção do desenvolvimento da (adequada) diversificação económica de Macau no contexto da Grande Baía.

      Quer se queira quer não, o jogo é uma (para não dizer a única) atividade incontornável na economia de Macau e nas receitas que gera para os cofres públicos. As concessionárias de jogo são, e continuarão a ser, os maiores empregadores e contribuintes fiscais de Macau, impossíveis de ignorar ou disfarçar com chavões como “grandes empresas de turismo e lazer integrado”.

      De forma directa e pragmática, e sem floreados, o PPC vê o elefante na sala ao posicionar o jogo no centro gravitacional da diversificação adequada da economia, delineando quatro orientações-chave para a desenvolver: “[i]remos empenhar-nos na exploração dos elementos alheios ao jogo, na elevação do sistema de avaliação dos indicadores das actividades alheios ao jogo, no aperfeiçoamento científico dos projectos de investimento alheios ao jogo e da aplicação dos fundos, a fim de melhor contribuir para o desenvolvimento da diversificação adequada da economia”.

      Não é preciso ser um “talento” para reconhecer que o jogo tem sido historicamente, e continuará a ser, a única atividade económica capaz de gerar os fundos necessários para as reformas que se impõem no frágil tecido económico de Macau que o governo (não as concessionárias de jogo) deve liderar. Também não é preciso ser um iluminado para concluir que há uma necessidade (absolutamente) premente de, no ciclo político que se inicia a 20 de Dezembro, se abordarem questões que têm sido esquecidas. É urgente capitalizar os benefícios proporcionados por um sector ideologicamente “incómodo” para desbravar o caminho há muito delineado para o desenvolvimento de Macau (veja-se, a este respeito, o Projecto Geral de Construção da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin), que passa pela diversificação económica, seja ela qual for.

      O caminho para a diversificação da economia não se trilha através de regimes de subsidiodependência, mas sim através do desenvolvimento de sectores ou áreas de actividade (não jogo) com elevado potencial de empregabilidade. Além disso, a diversificação não é para ser feita pelos locais, mas por entidades externas que com alguma arte se consigam atrair, as quais, por sua vez, trarão os tão aclamados “talentos” e quadros qualificados que darão um novo alento à economia. Para tanto, há que criar condições favoráveis para atrair esse novo sangue, explorando as vantagens que Macau tem para oferecer, seja a baixa tributação fiscal, o acesso directo à Grande Baía ou a ligação aos países de língua portuguesa. É urgente criar massa crítica, repensar e agilizar mecanismos como o da contratação no exterior ou, para ir ao pequenino, não criar obstáculos à simples abertura de contas bancárias por sociedades comerciais registadas em Macau.

      De igual modo, como refere o PPC, é premente continuar a apostar e a desenvolver um modelo turístico mais diversificado, seja de saúde, arquitetónico (destacando marcos como o Morpheus de Zaha Hadid), desportivo (atraindo eventos desportivos que promovam Macau, como o Grande Prémio de Macau), cultural (aproveitando os 450 anos de história colonial portuguesa e os locais classificados como Património Mundial pela UNESCO), aquático (que continua a faltar, apesar de Macau ser constituído por uma península e duas ilhas), de convenções e familiar (reforçando e reinventando o “Mirage Effect” de Las Vegas dos anos 90). E, já agora, com muitas esplanadas!

      Durante a negociação dos actuais contratos de concessão de jogo, um dos méritos do governo de Macau foi conseguir vergar as concessionárias de jogo a comprometerem-se com planos de investimento faraónicos, avaliados em MOP$142,7 mil milhões. Distribuído de forma errática entre as concessionárias de jogo, com base num critério (ainda) por conhecer (Venetian – 21,2%; Galaxy – 19,8%; Wynn – 12,4%; MGM – 11,7%; SJM – 9,8%; Melco – 8,3%), tal montante equivale a cerca de MOP$1,2 mil milhões mensais quando dividido pela duração das actuais concessões de jogo (10 anos).

      De acordo com os contratos de concessão de jogo, este mesmo montante destina-se aos projectos constantes das propostas de adjudicação das concessão de jogo apresentadas pelas concessionárias, que incidem nas seguintes áreas: “(1) Origem dos visitantes internacionais; (2) Convenções e exposições; (3) Espectáculos de entretenimento; (4) Eventos desportivos; (5) Cultura e arte; (6) Saúde e bem-estar; (7) Diversões temáticas; (8) Cidade de gastronomia; (9) Turismo comunitário; (10) Turismo marítimo; (11) Outros.

      Volvidos quase dois anos do início das actuais concessões de jogo, os projectos concretos que integram os planos de investimento das concessionárias de jogo continuam envoltos em segredo, suscitando dúvidas sobre a sua existência. A execução dos referidos planos está muito aquém das expectativas. A disparidade entre o montante que deveria ter sido gasto até ao momento e os projectos realizados é gritante.

      Os planos de investimento não foram concebidos para, em primeiro plano, pagar eventos como o Festival da Lusofonia, financiar exposições de automóveis ou de arte, patrocinar as edições do Grande Prémio de Macau ou da Maratona de Macau, ou trazer jogadores de snooker. Devem estes planos ser executados para fins de revitalização urbana ou tarefas públicas que cumpre ao governo desempenhar? Não podem, com toda a certeza, ser usados para (pasme-se!) despesas operacionais das concessionárias de jogo (como uma delas apregoa). Ademais, atentas as áreas-destino dos mesmos planos de investimento, a parte de leão não pode destinar-se a investimentos de capital das concessionárias de jogo (como uma delas também afirma).

      A sua execução devia estar estrategicamente afecta à construção planeada e faseada do projeto de Macau como centro mundial de turismo e lazer na Ásia. Apesar de este projeto estar em desenvolvimento há muito tempo – veja-se, por exemplo, o Relatório Fundamentado que serviu de base à atribuição das concessões de jogo em 2002 – o mesmo tem vindo a descarrilar. Por exemplo, o período médio de permanência dos visitantes diminuiu, passando de 1,5 dias em 2019 para apenas 1,2 dias actualmente.

      Macau não pode continuar a ser um mero espetador “que se contenta com o espetáculo do mundo”. Não é suficiente amealhar e engrossar a reserva financeira e esperar que as reformas económicas estruturais se façam por encanto. Macau tem que estar no seu melhor, pois o objetivo é a integração de Macau na Grande Baía e não a sua absorção.

       

      ANTÓNIO LOBO VILELA

      Advogado e autor do livro “Macau Gaming Law”

       

       

      Ponto Final
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      Redacção do Ponto Final Macau