O candidato republicano às presidenciais nos Estados Unidos, Donald Trump, terá uma segunda oportunidade na liderança da Casa Branca, ao ser eleito para um novo mandato numas eleições que deram também ao seu partido a recuperação do Senado.
À chegada ao dia eleitoral, na terça-feira todas as sondagens apontavam para um empate técnico com a candidata democrata, Kamala Harris, nos sete estados considerados decisivos, mas Trump acabou por vencer em pelo menos quatro deles – Pensilvânia, Carolina do Norte, Geórgia e Wiscosin -, ultrapassando os 270 votos eleitorais necessários para, quatro anos depois, voltar a sentar-se na Sala Oval.
Descrito pelos adversários como uma ameaça para a democracia, um retrocesso para o direito de escolha das mulheres e incitador de violência, as “bandeiras” de Trump centradas no desempenho da economia e no controlo da imigração acabaram por vingar e permitiram-lhe também uma vitória no voto popular, seguindo com 51,1% contra 47,4% de Kamala Harris, ou cerca de 71 milhões das escolhas a nível nacional, mais cinco milhões do que a oponente democrata.
Num país pintado com o vermelho republicanos e pouco azul democrata, os partidários de Trump celebraram ainda na noite eleitoral a recuperação do Senado, ao ultrapassarem a fasquia de 51 eleitos, enquanto na Câmara dos Representantes seguiam igualmente na frente no apuramento com 201 mandatos, a apenas 17 da maioria e o controlo da totalidade do Congresso.
Com as contas ainda por fechar, Kamala Harris remeteu-se ao silêncio, tendo um dos seus coordenadores de campanha anunciado aos apoiantes reunidos, num ambiente sombrio, na Universidade de Howard, em Washington, que a actual vice-Presidente democrata apenas se iria pronunciar mais tarde.
Em contraste, Trump surgiu triunfante no Centro de Convenções de Palm Beach, na Florida, a declarar perante milhares de seguidores eufóricos “uma vitória nunca antes vista” na política norte-americana, depois de ter acompanhado a noite eleitoral no seu ‘resort’ em Mar-a-Lago.
Quando apenas a cadeia televisiva Fox, próxima dos republicanos, o declarava reeleito para um novo mandato, o ex-líder da Casa Branca destacou que os resultados lhe deram um “grande sentimento de amor” e que a nação lhe endossou “um mandato poderoso”.
Trump discursou cerca de meia-hora acompanhado da mulher, Melania Trump, que já apresentou como “primeira-dama”, dos filhos, do candidato a vice-Presidente, J.D. Vance, descrito como “uma escolha certeira”, do presidente da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, e do bilionário proprietário da rede X, Elon Musk, apontado como “uma estrela”.
À frente da sua equipa de campanha, o político republicano elogiou o trabalho dos seus apoiantes, que disse terem organizado cerca de 900 eventos, assinalando que nas eleições de 2016, que venceu contra Hillary Clinton, e de 2020, que perdeu para Joe Biden, o seu potencial foi subestimado.
Após esta vitória, pretende “ajudar o país a curar-se”, depois de quatro anos de administração Biden, e “reparar a fronteira” com o México, prevendo uma “era dourada” para os Estados Unidos. “Prometo não descansar até entregar uma América forte, segura e próspera que os nossos filhos merecem e que vocês merecem”, declarou o republicano, que deixou ainda um apelo para a unidade. “O sucesso vai unir-nos e vamos começar por colocar a América em primeiro lugar. Não vou desiludi-los”, declarou, retomando um lema de campanha, que várias vozes alertam para a iminência de um país recolhido ao isolacionismo e menos interventivo na ordem global, e também do movimento MAGA (“Make America Great Again”).
De imediato, foram divulgadas reacções de líderes internacionais, logo à cabeça de vários dirigentes populistas, como o húngaro Viktor Orbán, o argentino Javier Milei, ou o ex-Presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, felicitou Trump pela sua “impressionante vitória”, após o republicano ter lançado a dúvida sobre a continuação do apoio militar a Kiev contra a invasão russa.
O Kremlin indicou, por sua vez, que o Presidente russo, Vladimir Putin, não planeava felicitar Trump, que disse que resolveria o conflito ucraniano em 24 horas sem nunca explicar como o faria, adicionado que o futuro líder norte-americano será julgado pelas suas acções.
Os governantes das principais potências europeias também já dirigiram felicitações a Donald Trump, com o Presidente francês, Emmanuel Macron, e o chanceler alemão, Olaf Sholz, a prometerem “colaboração estreita” com Washington.
O secretário-geral da NATO, Mark Rutte, disse esperar que a Aliança Atlântica se mantenha forte, após o republicano ter ameaçado deixar os países-membros desprotegidos se não cumprissem as suas obrigações com a organização.
Noutra frente de conflito, no Médio Oriente, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, saudou o “maior regresso da história”, que oferece “um poderoso reengajamento na grande aliança” com Israel, ao passo que o grupo islamita Hamas reclamou o fim do “apoio cego à entidade sionista”, numa reivindicação seguida por muitos árabes-americanos e defensores da Palestina críticos da administração Biden durante a campanha eleitoral.
A China espera uma “convivência pacífica” com os Estados Unidos, depois de Donald Trump ter iniciado, no seu primeiro mandato, uma prolongada guerra comercial contra Pequim e que já ameaçou intensificar num segundo. O primeiro-ministro português, Luís Montenegro, também deu os parabéns a Donald Trump e disse estar empenhado em trabalhar numa “colaboração estreita” a nível bilateral, multilateral e da NATO. O chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, defendeu que há que trabalhar em conjunto com a futura administração de Donald Trump, e admitiu voltar à Casa Branca.
TAIWAN ESPERA TRABALHAR COM TRUMP PELA ESTABILIDADE REGIONAL
O líder do governo de Taiwan, Lai Ching-te, felicitou ontem Donald Trump pela sua eleição como novo Presidente dos Estados Unidos da América (EUA), com quem espera trabalhar para manter a “estabilidade regional” e continuar a aprofundar as relações. “Sinceros parabéns ao Presidente eleito. Estou confiante de que a nossa relação, baseada em valores e interesses partilhados, continuará a ser uma pedra angular para a estabilidade regional e levará a uma maior prosperidade para todos”, disse o líder taiwanês, numa mensagem publicada na rede social X.
Da mesma forma, a porta-voz do governo Karen Kuo disse, em comunicado, que Taiwan e os EUA mantêm laços “baseados em valores e crenças comuns, como a liberdade e a democracia, independentemente do partido político que está no poder”. “Continuaremos a fortalecer os laços no futuro, nas bases existentes. Trabalharemos em conjunto com o novo Governo e continuaremos a aprofundar as nossas relações amistosas com os partidos Republicano e Democrata nos Estados Unidos”, disse a porta-voz.
Karen Kuo acrescentou que, face a uma situação global “turbulenta”, o novo Presidente norte-americano será “um actor chave para garantir a paz global, a estabilidade, a prosperidade e o desenvolvimento sustentável da democracia”. “Terá uma responsabilidade particularmente importante face aos desafios globais cada vez mais graves. Taiwan está disposto a desempenhar um papel mais relevante para os Estados Unidos. Continuaremos a trabalhar em estreita colaboração pela segurança e estabilidade”, acrescentou a porta-voz presidencial.
COREIA DO SUL QUER MELHORAR ALIANÇA ENTRE OS DOIS PAÍSES COM TRUMP
O Presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, felicitou ontem Donald Trump pela vitória nas eleições norte-americanas, e disse que espera trabalhar mais estreitamente com os Estados Unidos no futuro. “Sob a sua forte liderança, o futuro da aliança entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos da América será melhor,”, reagiu Yoon nas redes sociais, segundo a agência francesa AFP. “Aguardo com expectativa a continuação da nossa estreita cooperação no futuro”, acrescentou.
Em ruptura com o antecessor Moon Jae-in, Yoon adotou uma linha mais dura com a Coreia do Norte, que possui armas nucleares, ao mesmo tempo que melhorou os laços com Washington, um dos aliados de Seul em matéria de segurança.
Os Estados Unidos condenaram na segunda-feira uma segunda salva de mísseis disparados pela Coreia do Norte, que coincidiu com as eleições norte-americanas, afirmando que Pyongyang estava a violar as resoluções do Conselho de Segurança da ONU.
A administração do Presidente Joe Biden afirmou na semana passada que cerca de 8.000 soldados norte-coreanos tinham chegado à região fronteiriça da Rússia com a Ucrânia, treinados e prontos para o combate.
Em Julho, a Coreia do Norte declarou-se “totalmente pronta para um confronto total com os Estados Unidos”, enquanto Trump elogiou as suas ligações com Kim Jong-un durante a campanha. “Acho que ele [Kim] sente a minha falta”, disse Trump na altura, acrescentando que “é agradável conviver com alguém que tem muitas armas nucleares”.
Durante o mandato presidencial anterior (2017-2021), Trump encontrou-se com Kim três vezes, começando com uma cimeira histórica em Singapura, em junho de 2018, mas sem fazer grandes progressos nos esforços para desnuclearizar a Coreia do Norte.
Desde o fracasso de uma segunda cimeira em Hanói, em 2019, Pyongyang abandonou a diplomacia e redobrou os esforços para desenvolver o arsenal militar, rejeitando as propostas de diálogo de Washington. Trump também se encontrou com Kim na fronteira entre as duas Coreias, no final de Junho de 2019, e deu 20 passos em território da Coreia do Norte.
JAPÃO QUER MANTER “AMPLA COOPERAÇÃO”
O Japão declarou estar pronto para manter uma “ampla cooperação” com os Estados Unidos em matéria de segurança e a manter a atual ordem internacional, independentemente de quem ganhar as eleições presidenciais. “Estamos a acompanhar de perto as eleições norte-americanas e os seus processos para detetar possíveis influências”, disse o secretário-geral do Governo japonês, Yoshimasa Hayashi, quando questionado sobre uma previsível vitória do republicano Donald Trump.
Hayashi recusou-se a comentar os resultados antes de serem definitivos, mas reafirmou a vontade de Tóquio de manter a cooperação com Washington sob a nova administração resultante das eleições de terça-feira. “A aliança nipo-americana é a base da diplomacia e da segurança do Japão”, afirmou, citado pela agência espanhola EFE.
Hayashi referia-se à política externa e à aliança militar do Japão, em vigor desde 1960, que permite a presença de bases militares norte-americanas em solo japonês, bem como um compromisso de defesa mútua. “Vamos continuar a nossa cooperação em vários domínios e como parceiros globais com um papel fundamental na manutenção de uma ordem internacional livre e aberta, ao mesmo tempo que reforçamos a capacidade de dissuasão da nossa aliança”, acrescentou durante uma conferência de imprensa.
O regresso de Trump à presidência pode significar que voltará a exigir que o Japão aumente as contribuições para acolher bases norte-americanas, um pedido que fez na campanha a outros aliados dos Estados Unidos, como a Coreia do Sul.
Bolsas chinesas em queda
As principais praças financeiras chinesas registaram ontem perdas generalizadas, face às projecções que dão como quase certa a vitória do ex-presidente e candidato republicano, Donald Trump, nas eleições norte-americanas. O índice de referência da Bolsa de Valores de Hong Kong, o Hang Seng, fechou com perdas de 2,23%, com especial incidência para a tecnologia – um dos sectores mais afectados pelo deteriorar das relações entre Pequim e Washington – cujo índice perdeu 2,54%. E, apesar de ambas terem chegado a meio da sessão em terreno positivo, as duas principais bolsas da China continental, Xangai e Shenzhen, acabaram por fechar com quedas de 0,09% e 0,35%, respectivamente. O índice CSI 300, que mede o desempenho das 300 principais ações destes dois mercados, caiu 0,5% no encerramento das negociações. Alguns especialistas sublinharam também que, caso Trump regresse à Casa Branca, a dimensão do pacote de estímulo fiscal que está a ser negociado pelos legisladores chineses esta semana poderá ser até 20% maior do que se Harris ganhar. O ex-presidente, que iniciou uma guerra comercial contra a China em 2018, prometeu impor taxas alfandegárias de 60% sobre as importações do país asiático.
Eleição de Trump representa uma “grave ameaça aos direitos humanos”
A Human Rights Watch (HRW) considerou ontem que a eleição de Donald Trump como o 47.º Presidente dos Estados Unidos da América (EUA) representa uma “grave ameaça aos direitos humanos” quer no país, como no mundo. Para justificar as suas preocupações, a organização não-governamental (ONG) apontou, em comunicado, o “historial de abuso de direitos de Trump durante o seu primeiro mandato”, destacando “o seu abraço aos apoiantes e à ideologia da supremacia branca”. A HRW criticou ainda as “políticas antidemocráticas e anti-direitos extremos propostas por grupos de reflexão liderados por antigos assessores [de Trump] e as promessas de campanha, incluindo a de reunir e deportar milhões de imigrantes e retaliar contra adversários políticos”. No mesmo comunicado, a organização recordou a recolha que fez das “violações de direitos” durante a primeira administração Trump, entre 2017 e 2021, como as “políticas e esforços para expulsar requerentes de asilo e separar famílias na fronteira EUA-México” ou “alimentar uma insurreição violenta para derrubar os resultados de uma eleição democrática”, numa referência à invasão do Capitólio (sede do Congresso norte-americano) ocorrida em 6 de Janeiro de 2021.