Paul French
Daniel Carney – Macau (1984)
Em meados dos anos 80, quando o romance de Daniel Carney, Macau, foi publicado, quase todos os críticos o compararam aos romances de James Clavell, Tai-Pan e Shōgun, que tiveram um êxito fenomenal nas décadas de 60 e 70. Macau era certamente um candidato a besteller, tal como todos os bestsellers de Clavell, com cerca de 500 páginas. E Carney procurou claramente capitalizar o fenomenal sucesso de vendas global de Clavell – tanto Tai-Pan como Shōgun venderam milhões de exemplares em várias línguas e foram rapidamente adaptados ao cinema e à televisão. Assim, se o grande público leitor de todo o mundo tinha devorado os contos de Clavell sobre os vaidosos comerciantes britânicos que fundaram Hong Kong ou a sua versão do envolvimento estrangeiro na política interna (e nas guerras) do xogunato do Japão, então certamente que um conto ambientado na longa história da mais antiga colónia da Europa no Extremo Oriente era um vencedor, certo?
No entanto, enquanto as pessoas continuam a ler Tai-Pan, e a nova e sumptuosa produção televisiva de Shōgun trouxe a essa história uma geração de novos fãs, o romance de Carney, Macau, está praticamente esquecido, definhando ignorado em livrarias de segunda mão à espera que alguém o compre a troco de cêntimos. Clavell tem-se mantido constantemente no prelo, enquanto Carney, apesar de ter vendido bastante bem no seu auge, é pouco recordado actualmente.
O próprio Daniel Carney teve uma vida interessante. A sua família tinha ligações à China – o pai tinha sido colocado em Qingdao e Shangai como diplomata antes da Segunda Guerra Mundial. Tinha duas irmãs mais velhas, ambas nascidas na China. Detida na Shangai ocupada pelos japoneses, a família participou numa troca de prisioneiros e foi transportada para a África do Sul. Depois mudaram-se para Beirute, onde Daniel nasceu, em 1944. Finalmente, no início dos anos 60, Carney instalou-se na Rodésia (atual Zimbabué), tornou-se polícia colonial e depois agente imobiliário. Começou a escrever em meados dos anos 30, visando directamente o mercado dos romances históricos de grande sucesso que reinou nas livrarias dos aeroportos durante os anos 70 – Arthur Haley, Jackie Collins, Stephen King, James A. Michener, etc.
Carney começou por escrever sobre a Rodésia, mas só se tornou famoso em 1980, com o romance Under a Raging Sky, sobre um grupo de soldados mercenários no Congo dos anos 60. Hollywood adaptou o romance para o filme de Richard Burton e Roger Moore, The Wild Geese. Depois, procurou um novo tema que tivesse potencial para ser um êxito de bilheteira, mas Macau, publicado em 1984, viria a ser tragicamente o seu último livro. Carney morreu em 1987, de cancro, com apenas 42 anos.
Mas ainda temos o seu romance Macau…
Vendeu razoavelmente bem quando foi publicado, mas rapidamente saiu das tabelas de vendas. Porque é que não se saiu melhor? Talvez porque se seguiu a Noble House, de Clavell, de 1981 (a muito aguardada continuação de Tai-Pan), repetindo muitos dos temas desse livro – os problemáticos Hongs britânicos, a pirataria, a relação com a China recém-comunista, etc.
Macau centra o seu enredo numa organização criminosa macaense – o “Sindicato” – herdada por Crystal Lily, cujo único aliado é um “russo branco”, contrabandista de ouro (nos romances ambientados em Macau é sempre ouro, como os leitores habituais desta coluna saberão!), que abandona a reforma para ajudar Crystal a lutar contra tudo e todos, desde a tríade 14K até aos operadores dos casinos de Macau que reclamam o seu trono. Lily luta contra todos eles pelo controlo do florescente negócio de contrabando, afirmando-se como a heroína asiática do mundo dos casinos de Macau.
A antiga Rua da Felicidade, o Cemitério Protestante, a Praia Grande, o Hotel Lisboa e a Leprosaria de Coloane são alguns dos locais da narrativa, ainda que muitas vezes não ganhem vida na página. Em última análise, há demasiadas coisas a acontecer em Macau. Há demasiadas personagens para manter em ordem e enredos secundários para recordar – é certo que é típico do estilo de bestseller dos anos 70/80, mas Carney simplesmente não consegue, pelo menos tão bem coo Clavell, fazer malabarismos com todas os enredos secundários e com a imensa galeria de personagens que entram e saem de cena.
Dito isto, Macau é uma leitura suficientemente interessante, embora as descrições de Hong Kong sejam muito melhores do que as de Macau, o que é um pouco irritante, dado o título do romance. Desconfio que Carney terá passado muito tempo em Hong Kong e que, na melhor das hipóteses, fez apenas uma ou duas viagens de um dia a Macau.
Reler a continuação de Tai-Pan, de Clavell, Noble House, The Chinese Box, de Christopher New, ou The Honourable Schoolboy, de John le Carré, dá uma noção mais viva do tempo e do lugar (pelo menos em Hong Kong, se não sempre em Macau). Todos eles resistiram melhor ao teste do tempo do que Macau. Carney não atinge a sua marca, não atinge a sua fasquia alta, não permanece tanto tempo na mente. Mas, se tiver um longo voo pela frente e já tiver lido e relido todos os outros, Macau pode ajudar a passar as horas.