Em Macau, há mais censura, menos liberdade de expressão e mais restrições à participação no processo político local. As acusações são feitas pelos Estados Unidos da América, no relatório anual sobre direitos humanos do Departamento de Estado norte-americano. “A lei prevê a liberdade de expressão, inclusivamente para os membros da imprensa e outros meios de comunicação social, mas o Governo interferiu com este direito”, lê-se no relatório.
O Departamento de Estado norte-americano divulgou o relatório anual sobre direitos humanos sobre Macau, relativo ao ano passado. No documento, as autoridades norte-americanas acusam a região de restringir as liberdades civis, nomeadamente a liberdade de expressão, de imprensa e de participação no processo político.
“Interferência substancial no direito de reunião pacífica; incapacidade de os cidadãos alterarem o Governo pacificamente através de eleições livres e justas; sérias restrições à participação política, incluindo a desqualificação de candidatos pró-democracia nas eleições; e tráfico humano”. São estas algumas das denúncias feitas pelo Departamento de Estado dos EUA.
No que toca à liberdade de expressão, o relatório aponta que “a lei prevê a liberdade de expressão, inclusivamente para os membros da imprensa e outros meios de comunicação social, mas o Governo interferiu com este direito”.
“Tem havido relatos de censura crescente”, aponta o documento, que começa por recordar que, em Fevereiro de 2021, o Chefe do Executivo disse publicamente que o Governo garante liberdade de imprensa, mas que a comunicação social deve aderir ao princípio “amar a pátria e amar Macau”. Por outro lado, em Março, a TDM reuniu os jornalistas de língua portuguesa e inglesa para os avisar de que não deveriam divulgar informações contrárias às políticas do Governo Central; poucos meses depois, a TDM censurou um programa “removendo imagens históricas de 4 de Junho na Praça de Tiananmen, bem como menções aos apelos para que se realizasse a vigília”.
A liberdade de participação dos residentes no processo político da RAEM também foi analisado pelo departamento norte-americano. O relatório começa por constatar que “a lei limita a capacidade de os eleitores alterarem o Governo através de eleições periódicas, livres e justas”, uma vez que as eleições não se realizam através de sufrágio directo. O Chefe do Executivo é escolhido por um colégio eleitoral de 400 membros e, dos 33 deputados à Assembleia Legislativa (AL), apenas 14 são escolhidos por sufrágio directo.
A acrescentar a isto, o Departamento de Estado norte-americano recorda que, nas eleições para a AL que se realizaram em Setembro de 2021, todos os candidatos pró-democracia, incluindo dois deputados em funções, foram afastados da corrida ao hemiciclo, sob o pretexto de não serem fiéis à RAEM. “As eleições não foram livres e justas”, pode ler-se no relatório.
Para os norte-americanos, também a liberdade de reunião e manifestação tem diminuído: “A lei prevê a liberdade de reunião e manifestação pacífica, mas foi restringida pelo Governo”. O relatório recorda que, em Macau, a lei não exige, para a realização de manifestações, a aprovação das autoridades policiais, apenas uma notificação prévia. No entanto, o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) impediu a realização de uma vigília pelas vítimas do massacre de Tiananmen, uma vigília que já se realizava há mais de 30 anos. “Foram citadas restrições sanitárias, os tribunais negaram permissão com base na conclusão de que ‘slogans’ e faixas ‘provocatórias, difamatórias, e contrárias à verdade’ difamariam o Governo da RPC”, explica o documento.
Além disso, em Março do ano passado, também foi impedida uma manifestação em protesto contra o golpe de Estado no Myanmar. A iniciativa partia de trabalhadores não residentes daquele país e, na altura, o CPSP disse que só residentes de Macau poderiam realizar manifestações.
Quanto a questões de privacidade, o relatório aponta que o Governo geralmente respeita este princípio. No entanto, o sistema de videovigilância com reconhecimento facial provoca receios de que esse sistema possa ser usado para violar a privacidade de alguns cidadãos.
Este relatório fala também na violência doméstica e lembra que, em 2019, as autoridades apenas investigaram 17 dos 107 casos de violência doméstica que lhes foram comunicados. No mesmo ano, o Ministério Público apenas moveu acusação em oito casos. “Deputados e organizações sociais não-governamentais declararam que a lei sobre a violência doméstica era insuficiente, uma vez que houve uma alta taxa de denúncias, mas uma baixa taxa de investigações, e baixa taxa de acusações”, diz o relatório, que elogia também o Governo de Macau, dizendo que “encaminhou as vítimas para receberem tratamento médico, e os assistentes sociais informaram-nas sobre os seus serviços”. “O Governo financiou organizações não-governamentais para prestar serviços de apoio às vítimas, incluindo serviços médicos, aconselhamento familiar, e alojamento”, salienta o documento.
Quanto à discriminação de género, os norte-americanos apontam que o Governo de Macau tem feito cumprir a lei. Porém, algumas notícias “indicam que a discriminação persiste e as diferenças de género no trabalho continuam a existir, com as mulheres a ficarem concentradas em sectores com menor remuneração e trabalhos com menor remuneração”.
O PONTO FINAL tentou obter uma reacção por parte do Governo a este relatório do Departamento de Estado norte-americano, mas não obteve resposta até ao fecho da edição. Habitualmente, o Executivo reage aos relatórios anuais do Departamento de Estado dos EUA sobre a RAEM.
PONTO FINAL