Fotografia: Eduardo Martins
Depois de uma sessão na Assembleia Legislativa (AL), uma das muitas em que participou desde que foi eleito como deputado em 2017, Sulu Sou aponta para a tabuleta junto aos sofás do bar da AL, que indica que os lugares são reservados a deputados, e conta que já apresentou várias propostas para que qualquer cidadão se pudesse sentar neles. A resposta: “vão fazer estudos”, ri-se. Apesar da restrição, é lá que Sulu Sou diz ao PONTO FINAL que “a política é arte”. Por isso, quer “ter um bom desempenho em palco”. Na conversa, recorda a infância, aponta o tabu que é a política em Macau, explica a posição da Novo Macau nos protestos de Hong Kong, e critica os colegas deputados, que até sugeriram que mudasse de penteado.
Nasceu em Macau há 28 anos, filho de uma mãe de Macau e um pai do interior da China. Ambos apolíticos. Cresceu na zona Norte da península, brincou nas ruas da Areia Preta, de Toi San e do Iao Hon. “Como era filho único, quando via os meus amigos na escola ficava entusiasmado e falava muito”, diz o deputado, explicando a dor de cabeça que era para os professores do Colégio Diocesano de São José, que frequentou desde o infantário até ao liceu. “Muitos professores faziam queixa de mim por eu ser reguila, eu falava muito com os meus colegas durante as aulas”. Contudo, as notas sempre foram boas: “Ninguém, nem os meus pais, me pressionaram para estudar, para fazer os trabalhos de casa, eu fazia-os por mim, fazia-os a tempo e estudava”. “Tenho vindo a ser sempre esse reguila”.
A GÉNESE DE UM POLÍTICO
Aos 18 anos, decidiu ir para a Universidade de Taiwan. Fez duas licenciaturas ao mesmo tempo, Ciência Política e Estudos de Género. Começa por dizer que não sabe porque é que seguiu o rumo da Ciência Política e que, antes de Taiwan, era “uma folha em branco”. Mas depois confessa que houve três motivos: Hong Kong, as injustiças e Tiananmen.
Os debates entre os deputados do Conselho Legislativo de Hong Kong, que via na internet, foram a primeira razão. “Achei interessante, fiquei entusiasmado ao ver os debates. Isso inspirou-me”. “A segunda razão foi a minha personalidade. Quando era novo e via alguma injustiça, não me conseguia controlar, tinha de dizer algo. Além disso, quando era novo, eu era muito emocional, mais do que racional”, conta. A terceira razão, lembra, foi uma vigília pelas vítimas do massacre de Tiananmen, em que participou no final do ensino secundário.
Além disso, também Chui Sai On, actual Chefe do Executivo, teve o seu papel. Numa sessão pública de perguntas ao então candidato a líder do Governo, em 2009, Sulu Sou estava lá: “Eu preparei-me muito antes, preparei uma pergunta e fi-la: ‘Como é que o Governo vai recuperar a confiança do público depois do caso de Ao Man Long?’”. Ao Man Long era secretário para os Transportes e Obras Públicas e foi detido em 2006 por corrupção. Tal como Chui o encorajou, também o Chefe do Executivo na altura se disse encorajado por Sulu: “Ele disse que eu o encorajei enquanto político, enquanto líder, para fazer face aos desafios e às questões do público para que ele desse o seu melhor e ouvisse os cidadãos”.
A VERGONHA DE ESTUDAR POLÍTICA
Mesmo depois de já estar a estudar em Taiwan, houve outro ponto de viragem na vida de Sulu Sou. Ponto de viragem esse que o tem acompanhado até hoje e que se chama Associação Novo Macau (ANM).
O democrata estava a licenciar-se em Ciência Política, no ramo de Administração Pública. Nos primeiros dois anos, nas férias de Verão, em resposta aos familiares que lhe perguntavam o que estudava, dizia apenas Administração Pública. “Nos primeiros dois anos, tinha medo de dizer que estudava Política. Muitas pessoas compreendem mal aquilo que é a política, acham que é uma coisa suja e que um jovem não lhe deve tocar. É uma mentalidade local”, explica.
Tudo mudou depois de um estágio de Verão que fez na Associação Novo Macau, em 2011. “Depois de ter feito o curso de Verão na Associação Novo Macau, comecei a ter noção daquilo que acontecia em Macau. Então, nos últimos dois anos da universidade, passei a responder que estudava Política. Foi um ponto de viragem”, diz.
Numa aula, ouviu de um professor: “Sei como é que vocês se sentem, os vossos pais estão contra o facto de vocês estudarem Ciência Política”. “Os pais gostam quando os filhos estudam Direito, Medicina, etc., mas muitos pais não esperam que o filho venha a estudar Política”, nota o deputado de Macau, ressalvando que, “quando se é médico ou advogado, é possível ajudar centenas ou milhares de pessoas, mas, quando se é deputado ou presidente da câmara, por exemplo, pode-se ajudar mais pessoas, toda a sociedade”.